O que para nós, significa ser URATE*

pelas palavras do nosso Hélder Tavares, redigidas para o Editorial da Revista Terra, nrº9

“O que me cativava era a vontade que aquelas pessoas tinham de dar alguns pontapés no marasmo que, por vezes, é a cultura e o lazer nestes pequenos centros, usando dos poucos recursos e de muita criatividade para entreter os, por vezes relutantes, conterrâneos.”

massa (mas-sa) s. f.
Corpo sólido, compacto: massa de chumbo.Mistura de água, areia e cal; argamassa. Arquitectura. Conjunto de uma obra arquitectónica: plano de massa. Pop. Dinheiro. Massa crítica, quantidade mínima de uma substância físsil necessária para que uma reacção em cadeia possa estabelecer-se espontaneamente e manter-se por si mesma.

O movimento associativo é feito de massa, de massas, nos seus mais diversos significados,interpretações e possíveis ramificações livres que cada um lhe queira dar. Iniciei o meu contato com os movimentos associativos, neste caso, através da União Recreativa “Os Amigos daTerra” (URATE), há já alguns anos, dez anos, onze…já não me recordo exatamente, também não é isso o que mais importa para aqui, a verdade é que me lembro perfeitamente daquilo que me interessou e me cativou em toda aquela massa na altura. Lembro-me de olhar com interesse para as atividades realizadas pela URATE, desde o teatro ao xadrez e, sendo muito sincero, nunca fui ator e sempre fui um fraco jogador de xadrez.

O que me cativava era a vontade que aquelas pessoas tinham de dar alguns pontapés no marasmo que, por vezes, é a cultura e o lazer nestes pequenos centros, usando dos poucos recursos e de muita criatividade para entreter os, por vezes relutantes, conterrâneos. Ia aos espetáculos de teatro organizados pela URATE e pensava,“Ali deve estar um grupo interessante de pessoas…”, e, talvez por conhecer algumas delas, lá fui eu parar. Não sei bem como nem com que finalidade, mas a verdade é que comecei a dar uma mão ali, outra acolá e lá me fui misturando com aquela massa. Com o passar do tempo fui me tornando amigo desta gente, fui-me diluindo cada vez mais na URATE, conhecendo os cantos à casa e às pessoas que nela habitavam.

 

E, sendo-vos agora totalmente sincero, aquilo que de facto me prendeu, no melhor e mais satisfatório sentido, foram as pessoas, as conversas, as atividades, as noites em que se abraçam ideias, esperanças, expetativas, sonhos por vezes.

Considero, por isso, que a minha chegada ao associativismo foi totalmente desinteressada e, mesmo assim, cheia de interesse. Ao fim deste tempo todo, tenho para mim que uma associação, um movimento associativo coeso, só pode augurar crescer e continuar a perseguir os seus sonhos se for baseado numa amizade verdadeira e correspondida entre os seus membros.

Tentei definir o movimento associativo, segundo o meu ponto de vista, através de uma só palavra. Não é tarefa fácil, digo eu, é impossível, dirão outros, por isso mesmo parti de uma palavra passando pelos seus diversos significados e achei que a palavra mais adequada era massa.

Uma associação é, ou deve ser, um corpo sólido, compacto nos seus ideais e objetivos. Deve conter em si mesma um grupo de pessoas que, partilhando de um conjunto significativo de ideais, procurem dinamizar, através das suas atividades, uma comunidade mais alargada de indivíduos, porque, desenganem-se aqueles que pensam que uma associação trabalha para aqueles que dela fazem parte. Mistura, argamassa.

A massa associativa é uma mescla de gente diferente, com aspetos distintos que as caraterizam, no entanto, terá de haver sempre uma argamassa que promove a união entre todos, seja ela um ideal comum, um objetivo momentâneo ou uma vontade unificadora.

Extrapolando, uma associação é também a argamassa que une e liga uma comunidade, que a reúne à volta de algo, que promove projctos interessantes e de interesse comum, a associação cria raízes, penetra na comunidade em que está inserida procurando trazer até si um grupo cada vez mais alargado de pessoas.


 

 

Poder-se-á dizer que uma associação é também uma obra arquitetónica, com diversas bases que sustentam outras tantas colunas, um edifício que é construído para durar e sustentar o calor dos verões associativos mas também as piores intempéries.

Usando um sentido mais popular para a palavra massa, mas não querendo de forma alguma dizer que o associativismo é, ou se relaciona diretamente com o dinheiro, tenho de admitir que este é parte importante nas atividades que realizamos e, neste sentido, há uma simbiose entre o associativismo e a comunidade que o apoia. Assim, nunca é demais agradecer àqueles que nos apoiam sempre para podermos realizar mais e melhores atividades.

Por fim, associativismo é, acima de tudo, massa cinzenta. É essa vontade de pensar, de desenvolver projetos, de criar coisas novas, de dar algo à comunidade que faz viver uma associação.

A massa cinzenta é a gasolina e o motor de arranque do movimento associativo, da sua inquietação e constante vontade de inovar. Estar envolvido neste movimento estimula, sem dúvida, a criatividade, obriga-nos a fazer muito com o pouco que temos ao nossodispor. Extrapolando novamente, para assuntos menos felizes, se os nossos governos se inspirassem um pouco nas associações portuguesas, certamente que o país não teria a dívida que tem e estaria bem mais desenvolvido.

(...)

Como já disse, talvez vezes de mais, o movimento associativo é massa, para as massas. Contudo, para que o movimento associativo persista é necessário que haja uma dança saudável entre a comunidade e associação, é necessário que as células se renovem, que a associação seja comunidade e a comunidade seja associação, não basta participar, é preciso pensar e pôr em prática."

Um bocadinho da nossa estória *

por Fernando Teixeira para um artigo publicado na Revista Terra alusiva aos 10 anos da URATE

A história dos Amigos da Terra é o cruzamento de estórias e experiências daqueles que a fundaram e que nela trabalharam activamente. Houve pessoas que se destacaram quer pela presença marcante, quer pela presença constante, como o caso do José Augusto, mas todos os que por aqui passaram foram importantes e trouxeram contributos melhorados a esta associação.


Será difícil recuar o suficiente para dizer onde começa o projecto desta associação, visto atrás de uma história haver outra história. O núcleo maioritário dos fundadores dos Amigos da Terra (9 desses sócios), reuniram-se num informal grupo de jovens no ano de 1995, que se apelidou de Grupo de Jovens de Carregosa, onde durante três anos trabalharam em projectos do interesse dos jovens, da paróquia e da freguesia. Aqui ganharam a experiência e o gosto no convívio associativo e na dinâmica organizacional, percebendo-se os benefícios que o associativismo traz a quem por ele é tocado. Algumas das pessoas que se juntaram a este grupo de jovens, já tinham passado por outros grupos de Jovens ou até pelos movimentos dos convívios fraternos. Foi neste grupo de jovens que surgiram as primeiras dinâmicas teatrais, o caso de um teatro que foi feito para um grupo de jovens visitantes alemães, relativo ao tema da libertação de Timor Leste (que na altura ainda era uma causa para os jovens).

Existiram também experiências na organização de festas de catequese, tasquinhas nas festas de Silvares ou Costeira, e festas na altura do Carnaval. O primeiro grande Ciclo Paper de Carregosa foi organizado pelo Grupo de Jovens de Carregosa em 1996. Foi neste caldeirão que se formaram as ideias para os Amigos da Terra.

Com a extinção do Grupo de Jovens de Carregosa, algo que aconteceu naturalmente por volta de 1998, os amigos que daqui saíram continuaram a sua caminhada e reuniam-se na sede da associação juvenil “Universitários de Carregosa”, tornando-se activos aqui, participando nas actividades do xadrez e aprendendo com a experiência do Manuel Ferreira, sobre como organizar uma associação. Foi nos Universitários de Carregosa que se juntaram aos 9 fundadores os últimos 2, o Hugo e o Hélio, que na altura eram os mais jovens, mas já demonstravam interesse em participar e ajudar a criar este projecto.


Em 1999 falávamos já na formalização de uma associação para os jovens de Carregosa que nos desse as pernas para fazer o que gostávamos de fazer, de uma forma formal, com uma identidade que fosse reconhecida e respeitada, e lembro-me perfeitamente da primeira vez em que o José Augusto sugeriu o nome; íamos numa caminhada pelo lugar do Barreiro, quando ele me disse que tinha o nome para esta associação: “Os Amigos da Terra”. Era um nome difícil de não se simpatizar. Passado pouco tempo tivemos uma reunião em casa dos pais dele, em Março de 1999, que ficou registada como a primeira reunião dos Amigos da Terra.

Já nesse ano, apesar de ainda não termos formalizado a associação, organizamos o Grande Ciclo Paper de Carregosa sobre a responsabilidade dos “Amigos da Terra”. Quem consultar o cartaz dessa 4ª edição do Ciclo Paper em 1999 e, simultaneamente, consultar os autos de notário de 2000 em que se formaliza a associação não há-de deixar de sorrir com a ideia de que uma associação, que formalmente ainda não existia, estava já a trabalhar em prol da juventude e de Carregosa.

No ano de 2000 inicia-se formalmente este projecto. Registam-se os estatutos no notário, cria-se o regulamento interno que tem sido um documento basilar do funcionamento da associação, elegem-se os corpos sociais entre os elementos fundadores, e faz-se a apresentação pública da associação pensando-se num grande projecto para dar a conhecer a associação a Carregosa e ao concelho de Oliveira de Azeméis.

 

Curiosamente este período de transição de século foi frutuoso para a nossa vila no aparecimento de novas associações. Devem-se registar o aparecimento, por estes anos, da Associação Cultural e Desportiva de Azagães, da Associação Cultural e Etnográfica Cultural de São Miguel de Azagães, e ainda da União Desportiva e Recreativa de Teamonde. Surgiram ainda duas Associações de pais.

Neste caldo associativo, os Amigos da Terra aproveitam a oportunidade para reunir as sinergias de todas estas entidades, mostrando o seu trabalho e, ao mesmo tempo, dando a oportunidade a todos de o fazerem. Foi lançada assim a iniciativa “Julho 2001” que tencionava ser a primeira grande iniciativa desta jovem associação. O “Julho 2001” foi um projecto cultural de um mês, que preenchia cada dia do mês com actividades organizadas rotativamente pelas várias associações carregosenses. Durante este mês houve exposições, inauguração da Biblioteca, lançamento de um livro, provas de xadrez, passeios de cicloturismo e todo o terreno, estreia do grupo de teatro com o “Auto do Iate do Inferno”, folclore, fado, música filarmónica, coros, encontros-convívios, jogos populares, jogos entre as escolas... Foi um mês em cheio, com os créditos das várias actividades entregues a quem de direito, mas com os créditos da organização para a Urate.

Por esta altura, os Amigos da Terra tinham a funcionar a secção de xadrez herdada através de protocolo dos Universitários de Carregosa, a secção de teatro que se tornou a área mais activa da associação contando hoje com 4 grupos de teatro, a secção de literatura que inicialmente geriu a Biblioteca Pública de Carregosa, onde se destacou o trabalho da falecida Lucília Melo, grande amiga da associação e mãe do próximo presidente da associação Renato Melo. 

Durante estes 10 anos a associação criou outras secções, caso da secção de ciências que nos tem trazido várias exposições científicas e, anualmente, tem organizado observações astronómicas; a secção de dança Ponta Solta, que mostrou a grande capacidade dos jovens em realizar trabalhos de qualidade quando se lhes dá as ferramentas e o acompanhamento necessário. Existe ainda a actual secção de Desporto e Lazer em que se encaixam as actividades desportivas.

Mas ao longo dos anos os Amigos da Terra souberam crescer e inovar. Será difícil falar de todas as iniciativas ou projectos ao longo de dez anos, pois foram tantos, mas pode-se dar destaque ao Festival da Juventude que aglomera os jovens e os motiva para o voluntariado, o Festival de Teatro “Festola” que anualmente proporciona acesso cultural à população, esta revista Terra que documenta e regista a história das associações e de Carregosa.

Actualmente, a associação “Amigos da Terra” tem uma identidade perfeitamente definida e é reconhecida pela qualidade do seu trabalho. O sucesso desta associação tem-se baseado em confiar nos jovens, ensinando-os e fazendo-os ganhar confiança. As pessoas que dirigem hoje a associação acompanharam os líderes anteriores e cabe aos actuais líderes fazer-se acompanhar dos futuros. É assim que os Amigos da Terra ajudam a criar uma sociedade melhor, com jovens adultos preenchidos com valores morais, éticos, capazes de fazer e de serem grandes Homens.